(São Paulo: Patuá, 2017)
"cadeira, óculos, agulha...
no alto da ladeira de pedra,
vô Quirola remenda
as redes de pesca. [...]" (p.51)
Olá leitores! Hoje é dia de poesia, meu assunto preferido...Chegou-me às mãos ainda em maio deste ano a obra poética do jovem autor caxiense Francisco de Assis Carvalho da Silva Jr - ou simplesmente Carvalho Jr., cidadão de Caxias - MA. O poeta é bastante conhecido por aqui e já possui um reconhecimento merecido para além da região dos Cocais, o que não me surpreende, uma vez que seus versos tem qualidade. E ter qualidade na arte poética não é apenas escrever poemas que falem ao coração. É ter riqueza de linguagem. É ter coragem de expressão. É saber ser significativo hoje e sempre. E Carvalho Jr. pode se gabar de reunir esses adereços.
O livro em si, enquanto objeto-poético, é bem convidativo: o layout e a disposição interna dos poemas, bem como a escolha das epígrafes na abertura de cada uma das partes do livro salta aos olhos. É gostoso de ver, e depois a leitura torna-se mais prazerosa ainda.
Quanto à temática, eu dividiria esta obra em dois momentos: primeiro temos poemas que nos ligam à infância, ao corpo-erótico, à solidão. Porque se conhecer e (re)conhecer sua essência é necessário; o medo e o silêncio são latentes, mas a coragem de viver é maior:
"teu nome é uma tejubina - libélula - borboleta
que dança os meus arco-íris da infância
nas armadilhas e incêndios de uma bolha de sabão." (p.30)
Em um segundo momento, o "índio fantasma da tribo Quirola" (que é como se define o eu poético) nos mostra um espaço muito bem traçado, com elementos que se voltam para a memória da cidade, com a denúncia recorrente de sua decadência e o descaso de seus habitantes; temos também o rio que perpassa tudo e todos e que, juntamente com o povo, tenta resistir às violências do cotidiano. É sempre interessante ler poetas que nunca se esquecem de sua função social. Porque a palavra bem dita tem força; ela se espalha e não se perde:
"passa o rio como um cachorro magro...
tudo que bebe são assobios de socós
e a seca indiferença dos bocós." (p.39)
Finalizo por aqui, me permitindo dizer o que eu mais gosto nos poemas de Carvalho Jr.: é o uso da explosão de cores e de neologismos com que ele burila a palavra; sua concisão e ironia me agradam muito. Abusar da linguagem assim é um exercício que requer prática para não parecer óbvio. Porque, na verdade, como disse o poeta francês moderno Paul Valéry, o poema é uma espécie de máquina de produzir o estado poético através das palavras, muito embora não saibamos o efeito da ação dessa máquina a longo prazo em nossos espíritos. O efeito dessa "máquina" em mim hoje é de êxtase e de contemplação. Só posso me emocionar com o que é verdadeiro para meus olhos:
"pare,
olhe,
escute:
nem o trem
nem a fome
do mundo
passaram
ainda."(p.27)