domingo, 21 de abril de 2013

O brilho de uma paixão - ou a vida de John Keats


O brilho de uma paixão (2009) nos traz os últimos anos de vida do poeta romântico inglês John Keats, apesar de que a vida dele mesmo foi muito curta - morreu com apenas 26 anos. Todo o sentimento platônico romântico, toda a filosofia melancólica romântica, todos os matizes, toda a natureza exuberante e depressiva - facetas permanentes da estética romântica - são capturados aqui pela sensível direção de Jane Campion.


Seus últimos 2 anos de vida, os mais produtivos de John Keats, também revelam o ápice do envolvimento amoroso com Fanny Brawne, com quem chega a noivar em 1819 mas cujo casamento nunca chegaria a se concretizar, pois Keats além de viver às custas de amigos ainda estava doente - tinha tuberculose.


Muito lembrado pelo famoso poema romântico "La belle dame sans merci" (apenas o título está em francês, que significa "A bela dama sem piedade"), Keats consegue o reconhecimento nas rodas literárias e consequentemente na Literatura Inglesa quando publica o seu Lamia, Isabella, The eve of St.Agnes and other poems em 1821, meses antes de morrer.


Para Harold Bloom, um dos maiores críticos da atualidade, Keats viveu o Alto Romantismo; sendo influenciado pelas leituras de William Shakespeare, é considerado o "gênio da aceitação trágica", extremamente melancólico. Por intuir que não viveria muito, seus poemas, em sua maioria escritos no estilo clássico de ode, apresentam um eu lírico atormentado, inquieto, negativo e mórbido; porém a genialidade de Keats reside no uso perfeito da língua inglesa, que qualquer tentativa de tradução não consegue abarcar a emoção do poeta em suas longas odes. Temos aqui um trecho de sua Ode à Melancolia (Ode on Melancholy), um de meus poemas preferidos:

Ela tem Beleza - Beleza que há de morrer;
e enlevo, cuja mão sempre acena adeus,
estando o Prazer dolorido bem por perto,
buscando veneno enquanto a abelha suga:
Sim, é mesmo no templo da Alegria
que a Melancolia faz seu santuário,
sem ser vista, exceto por aquele
cuja língua explode a uva no céu da boca,
e cuja alma há de provar da força da dor,
e entre os seus troféus sombrios ser pendurada. [...]

É a clássica referência romântica ao estado permanente de tristeza, ou melancolia... Mesmo na alegria ela se instala imperceptível, pois a dor de viver é sempre maior - essa é a filosofia mais pura seguida e vivida por vários autores românticos, inclusive pelo nosso representante nacional, o poeta Álvares de Azevedo: na ânsia de viver reside a mesma ânsia de partir...







quarta-feira, 3 de abril de 2013

Doris Day & 60's fashion

Outro dia consegui assistir no Netflix um filme clássico, Confidências à meia noite (1958), com dois dos meus atores favoritos: Doris Day e Rock Hudson:


A história é bobinha mas bem gostosinha rsss: Day interpreta a decoradora Jan Morrow, que tem que dividir sua linha telefônica com o compositor e mega-conquistador-raparigueiro Brad Allen; as brigas entre os dois são constantes porque de tanto as mulheres ligarem pro Allen, a pobre Jan não consegue fazer nenhuma ligação! Claro que acontecem situações hilárias que vão levar os dois a se conhecerem depois e se apaixonarem...


Mas o que me chamou a atenção foi o figurino usado por Doris, selecionado por Bill Thomas...que já vem em ritmo de anos 60, com corte bonito, tudo combinado e bem colorido:

www.littledooronthesound.com



O look branco total está sendo muito usado novamente, não é dos meu preferidos mas é inspiração dos anos 60...Quanto ao filme, vale a pena assistir, ao menos pra ver a produção de arte que é muito bonita :)

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

4 anos sem Nascimento Morais Filho


José Nascimento Morais Filho (1922-2009), escritor e pesquisador maranhense... mas principalmente meu avô e mentor...Porque hoje faz 4 anos sem ele...Porque hoje quero compartilhar alguns versos seus, que ainda me emocionam:

As estrelas, meu irmão,
São as letras de luz da linguagem universal,
O coração, seus fonemas;
No entanto,
Não sabes ainda soletrar:
li-ber-da-de!



quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

A fonte das mulheres


A fonte das mulheres (La source des femmes, 2011) é um filme que deve ser assistido mais por homens do que por mulheres...ou o contrário, não sei rsss Porque tem aquela temática feminista, sabe? E trazer à tona um debate sobre direitos femininos em uma sociedade como a retratado na filme - uma aldeia árabe - é sempre delicado...


Mas aqui não tem nada de dramas, não!! Pelo contrário, a forma como as mulheres, lideradas por Leila, resolvem reivindicar por seus direitos é por si só muito engraçada: as mulheres casadas da aldeia se recusam a ter relações sexuais com seus maridos enquanto eles não as ajudarem a buscar água em uma fonte remota, localizada nas montanhas - essa função é exclusivamente feminina. Mas o argumento é super válido: enquanto elas se arriscam subindo e descendo a montanha diariamente para trazer água para casa, inclusive se acidentando e perdendo seus bebês, seus homens ficam o dia todo conversando e bebendo chá num "bar" local.


Leila, ao fazer sua "pequena revolução", é apoiada e orientada pelo apaixonado marido Sami, mas com o tempo percebe que não é tão simples mudar a forma de pensar tanto dos homens idosos quanto dos mais novos. Assim, ela, junto com as outras mulheres, procuram meios, uns engraçados e outros silenciosos, para se fazerem ouvidas, mas nunca afrontando as tradições, que elas sabem são importantes para que hajam respeito e solidariedade no contexto social em que vivem. 

 

O gênero do filme é comédia, mas discute muito apropriadamente questões que para nós, mulheres ocidentais ou que não seguem a religião islâmica, nem passam pelas nossas cabeças um dia ter que lidar. Por exemplo, o simples ato de se apaixonar e não poder casar com quem seu coração escolheu, e sim com quem seus pais já determinaram e "negociaram" para você. Outro ponto tocante na história é quando Leila revela ao marido que já não era mais virgem ao casar com ele; ela havia sido "costurada" por um médico porque senão seria repudiada. Mas ela justifica o fato por ter se entregado ao primeiro namorado por amor...só que o moço teve que casar com outra mulher, já escolhida previamente pelo pai.


Existe algo de muito belo e sensível nessa história: Leila só consegue mudar a opinião das mulheres daquela aldeia pois dá a elas o que lhes foi negado desde sempre - a educação pela leitura. Por ser casada com um professor e por ler muito - escondida, é verdade, da família de seu marido - são necessárias várias conversas e argumentos, inclusive utilizando o Alcorão, para convencer não só as mulheres, mas também seu líder espiritual, de que sua luta é justa. E pensar que tudo começou porque se queria ajuda para buscar água...



sábado, 26 de janeiro de 2013

A delicadeza do amor


A delicadeza do amor (La delicatesse, França, 2011) é um dos filmes mais belos e mais singelos que chegou às telas nos últimos tempos. E ele fala sobre o inesperado surgimento do amor...daquele tipo de amor que nasce sem os dois quererem, sabe?


Nathalie (a maravilhosa Audrey Tautou) vê toda sua vida mudar após a morte do marido, com quem vivia um casamento e existência felizes. Para aplacar sua dor, ela se joga no trabalho e nem percebe que com o passar dos anos sua imagem é vista como a de uma mulher que não só não possui uma vida pessoal, como a de alguém dura, incapaz de amar. Ao escutar essa descrição de si mesma pelos corredores da empresa, Nathalie faz algo inusitado: tasca um beijo na boca de um colega de trabalho, do nada!


Talvez ela faça isso para saber se ainda está viva, se realmente é capaz de sentir ou tocar alguém de forma íntima, e para isso nada melhor do que um beijo! Mas Nathalie não calcula a reviravolta que fará na vida de Markus (o engraçadíssimo François Damiens), o colega feio e desajeitado que ela escolhe justamente pra dar esse beijo! O que se segue é o aflorar de vários sentimentos "esquecidos" por Nathalie, começa uma espécie de readaptação a uma vida dita "normal"; ela se permite sair novamente, conhecer Markus, enfim, se abrir para o mundo novamente...e arriscar no terreno amoroso.


Ao se "permitir" deixar as coisas acontecerem - Markus não se acha merecedor da bela e inteligente Nathalie, portanto as ações dele são muito dignas de risos - os dois serão vistos pelos outros como um casal improvável e isso vai ocasionar situações no mínimo interessantes! Quanto à parte técnica, o título faz jus ao filme, que tem todas as sutilezas e delicadezas possíveis e belas: a metáfora do cabelo (ao se abrir para o amor, Nathalie começa a deixar o cabelo solto, o que é visto por Markus como algo sexy); o "primeiro beijo" oficial que Markus não consegue dar, mesmo com um cenário exuberante ao fundo com a Torre Eiffel etc.; o jeito que ela o toca no rosto e lhe diz que está tudo bem, que não liga para os olhares incrédulos dos outros...E quando perguntam a Markus como ele se sente ou qual o efeito que ela possui quando ele está com ela, ele responde: "Elle me permet d'être la meilleure version de moi même" (Ela me permite ser a melhor versão de mim mesmo).



Vale muito a pena assistir e se deixar levar por essa história de amor...pois no fim das contas, é assim mesmo que acontece: por nada ser definitivo é que devemos seguir em frente...


sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Byron Apaixonado...


Não é um romance, mas a autora Edna O'Brien bem que tenta romantizar a biografia de um dos maiores poetas da literatura mundial, Lord Byron. Ele não foi precursor do Romantismo inglês como acreditam alguns, mas foi quem consolidou essa estética que ultrapassou o simples âmbito artístico.


O'Brien discorre, explica e desmitifica todos os burburinhos que permeiam a vida de Byron. Por exemplo, o paradoxo de ter uma origem nobre mas sem muito acesso ao dinheiro em si; o recebimento do título de Lord aos 11 anos, a partir da morte do avô; suas más relações com sua mãe. Byron cresce em busca de companhias, bebidas e aventuras, e gradualmente sua paixão pela literatura coincide com a difusão do Romantismo na Europa - no caso dele, começo do século XIX. Os casos amorosos são realmente um capítulo à parte - amar o amor: era esse o comportamento de Byron; acender a chama e viver pelas conquistas, as quais não foram poucas e de ambos os sexos rsss


Por ser muito bonito, causava furor por onde passava, tanto em homens quanto mulheres, solteiros ou casados...O autor de inúmeros poemas passionais, melancólicos e de Don Juan estava sempre em busca de algo que não sabia bem o que era...o desespero de ser alguém importante além de seu título nobre o perseguia; o desejo de participar das grandes revoluções, sentimento muito próprio do Romantismo, o acometeu e o levou até a Grécia, para alistar-se na Guerra de Independência Grega. Lutar por uma causa que não era a sua acabou com sua vida, aos 36 anos: Byron contrai febre tifóide após galopar na chuva...


Qualquer pessoa que estude Romantismo não pode passar sem ler um poema de Byron...sem dúvida, o alto grau de subjetivismo e emoção são características recorrentes em seus poemas. A única exceção, e daí ele ser reconhecido como gênio em sua época por vários críticos, é a obra Don Juan: de tom satírico, retrata em versos (mais precisamente 17 cantos) as (des)venturas de Juan. A inspiração do personagem título vem das loucuras cometidas pelo próprio Byron e o colorido das cenas retratadas (as terras quentes banhadas pelo Mar Mediterrâneo) foram visitadas exaustivamente pelo poeta. Agradável de se ler e muito engraçada, deixo aqui com vocês um pouquinho desta obra tantas vezes injustiçada em sua essência; neste trecho é contada a primeira conquista de Don Juan - aos 16 anos ele se envolve com Dona Julia, senhora jovem e bonita, casada com um distinto e velho fidalgo...mas que não consegue resistir ao charme e às investidas do rapaz rsss:

[...]Os olhos dela (adoro olhos bonitos) eram grandes e negros, 
suprimindo metade do fogo quando ela falava,
e através desses olhos existia um suave disfarce,
que se iluminava numa expressão mais de orgulho do que de ira,
e de amor, e depois crescia nesses olhos algo que não era desejo,
mas poderia ter sido, talvez, se não fosse pela alma
que lutava contra este sentimento lá no íntimo.

Seu cabelo brilhante caía por sobre os olhos,
brilhante e inteligente, e belo, e suave;
o formato de suas sobrancelhas eram arqueadas,
suas bochechas eram rosadas como o brilho da juventude,
demonstrando às vezes um fulgor,
como se suas veias dilatassem.
Ela, na verdade, possuía graça e jeito incomuns;
ela era alta - eu odeio mulheres baixinhas.

Há alguns anos era casada com um homem de 50,
e tais maridos existem aos montes;
mesmo assim, penso que em vez de UM
era melhor ter DOIS de vinte e cinco,
especialmente em países quentes,
e agora me vem à mente que
damas de virtude mais "inquieta"
preferem um marido de no máximo 30 anos.

É uma coisa triste, devo dizer,
e é tudo culpa deste sol indecente,
que não deixa em paz nossa pobre carne!
Ao contrário, fica nos assando, queimando, grelhando,
que só nos resta rezar;
A carne é fraca, e a alma imperfeita;
o que os homens chamam de galanteio, e os deuses de adultério,
é muito mais comum onde o clima é sufocante. [...]
(tradução livre minha, do texto que pode ser lido no original aqui)

Alguma semelhança com nossa vida nos trópicos é mera coincidência, não é? :)