À MORTE
Morte, minha
Senhora Dona Morte,
Tão bom que deve
ser o teu abraço!
Lânguido e doce
como um doce laço
E como uma raiz,
sereno e forte.
Não há mal que não
sare ou não conforte
Tua mão que nos
guia passo a passo,
Em ti, dentro de
ti, no teu regaço
Não há triste
destino nem má sorte.
Dona Morte dos
dedos de veludo,
Fecha-me os olhos
que já viram tudo!
Prende-me as asas
que voaram tanto!
Vim da Moirama, sou
filha de rei,
Má fada me encantou
e aqui fiquei
À tua espera... quebra-me o encanto
Como sugere o próprio título, o poema tem
como tema central a morte, a qual nos versos iniciais é tida como senhora do eu
lírico; percebemos o diálogo ambíguo entre ambos nos versos 2,3 e 4, pois como pode a morte ter um abraço suave e doce?
Posteriormente o eu lírico vê a morte como um remédio
que sara e conforta todo mal, e nesse caso mais especificamente sara os males
do corpo. Para quem sofre demasiadamente, a morte muitas vezes é vista como
solução que leva a um destino onde não existe tristeza e nem má sorte (verso
8).
Claramente este eu lírico anseia pela morte, pois afirma nos versos 12,13,14 que somente
ela pode quebrar o encanto colocado por uma fada má, que o aprisionou em um único lugar
(supõe-se que esse aprisionamento seja o seu próprio corpo).
Relembrando o contexto histórico-social, a escrita do poema está
inserido na primeira geração modernista portuguesa, período em que vozes poéticas femininas ainda não gozavam de muito reconhecimento na Literatura. Também nesse período é evidenciado o sentimento
decadentista da autora, que já tinha sua vida marcada por algumas tragédias pessoais - um aborto fatal e a morte de seu querido irmão.
O poema À morte, assim como os demais poemas de Florbela Espanca, possui
estrutura de soneto (marca registrada da autora). Sobressai-se aqui a figura de linguagem personificação, pois a Morte é esperada como alguém desejada como cura para os males do eu lírico.
É interessante frisar que neste poema Espanca
evidencia sua essência sofrida e melancólica, que busca na morte uma saída para suas dores - por isso os críticos literários a denominam de neo romântica. Infelizmente, assim como neste poema, a vida da poeta
culminou no desespero mortal do suicídio.
*Francisca Lopes de Brito e Suzele Torres do Nascimento são alunas do 6º período do Curso de Letras/ Português da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA/ Campus Caxias). Esta análise poética foi solicitada como requisito avaliativo da disciplina Literatura Portuguesa - do Simbolismo às Tendências Contemporâneas ministrada por mim este semestre.