domingo, 12 de fevereiro de 2017

As sombras de Longbourn, de Jo Baker

(São Paulo: Ed. Companhia das Letras, 2014.)

O dia de lavar roupa era inadiável, mas ainda assim a lavagem semanal da roupa de cama e mesa da casa era uma perspectiva desalentadora para Sarah. O ar estava gélido às quatro e meia da manhã, quando ela começou a trabalhar. [...] Seria um longo dia de labuta, e aquilo era só o começo. (p.13)

Me interessei em ler As sombras de Longbourn justamente porque seu enredo retoma um de meus romances favoritos de todos os tempos: Orgulho e Preconceito, de Jane Austen. Mas retoma de um jeito diferente, que não pretende distorcer nenhum dos fatos que nós, que já lemos o famoso romance de Austen, conhecemos tão bem; não, não. As sombras retoma o mesmo enredo sob o ponto de vista da criadagem, principalmente de Sarah, a jovem empregada da família Bennett – família esta dona da propriedade Longbourn e pertencente à pequena aristocracia rural.

Órfã, Sarah foi levada ainda criança para trabalhar para os Bennett – foi acolhida pela governanta / cozinheira da casa, a sra. Hill, e pelo cocheiro, sr. Hill, ambos casados e que sempre a trataram como filha. Apesar da jornada diária de trabalho que logo lhe foi imposta e à qual cresceu acostumada, Sarah sempre soube que ali era o melhor lugar para ela, pois tinha abrigo, comida e compartilhava das gentilezas das senhoritas Bennett, principalmente de Elizabeth.

Porém, sua convicção é abalada quando seus patrões contratam o jovem e calado James Smith, para trabalhar como lacaio e ajudar o já cansado sr. Hill. Smith surge do nada procurando por emprego e ali encontra não só acolhimento mas também a simpatia de Sarah.

Dentre os vários percalços que se desenrolarão sob o olhar da jovem empregada, no que diz respeito às vidas de seus patrões, ela mesma terá que amadurecer e perder a ingenuidade, inclusive se perguntando: servir aos outros é realmente a que se resumirá toda sua vida? E quanto ao amor? Ela também não será merecedora, tanto quanto Jane e Elizabeth?

Ler As sombras permite conhecer o universo da criadagem de fins do século XVIII, tanto aquela que habitava o mundo dos Bennett quanto a que cercava a grande aristocracia, representada pelos senhores Bingley e Darcy (futuros maridos das primogênitas Bennett).

Por meio de suas pesquisas (até porque se declara megafã de Austen), a autora Jo Baker reconta Orgulho e Preconceito do backstage: por meio de uma linguagem fluida e gostosa, somos transportados para as pequenas alegrias e desejos assim como os infortúnios e angústias de pessoas que deviam passar despercebidas da rotina diária de seus amos.

Viver assim, inteiramente à mercê dos caprichos e das fantasias de outras pessoas, ela pensou, não era viver. (p.229)


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